No dia 6 de setembro de 1985 a criançada brasileira ficou em polvorosa com a exibição do piloto de um seriado no qual a grande estrela era uma motocicleta negra, super tecnológica que, além de disparar lasers, mísseis e metralhadoras, saltava de maneiras inimagináveis e alcançava 300 quilômetros por hora.
Na época, a grande sensação eram seriados de ação onde tudo girava em torno de máquinas super modernas, equipadas e armadas até os dentes, concebidas única e exclusivamente para combater o crime em grande estilo. Talvez o seriado mais famoso e marcante dessa leva tenha sido o seriado Super Máquina. Também haviam as máquinas do ar como o Águia de Fogo e Trovão Azul, ambos de muito sucesso. Mas como não poderiam ficar de fora, as duas rodas deram as caras com o seriado que deixou a molecada de cabelo em pé naquele setembro de 85, era a Moto Laser (Street Hawk nos Estados Unidos).
Arrisco dizer que o seriado foi o responsável por acender a chama do motociclismo em muita gente quando foi exibido. Qualquer moleque de 10 anos de idade ficaria babando na frente da televisão vendo uma motocicleta, que parecia ter saído do futuro, fazendo manobras perigosas, correndo a velocidades incríveis e disparando lasers! Lasers! E tudo isso sendo pilotada por um cara boa pinta, descolado e do bem que era o mocinho da história toda.
O sucesso foi tão grande que, como de costume, logo logo vários brinquedos da série foram lançados. Além de moto a fricção, moto bate volta e veículos de brinquedo da série, tinha até um “autorama” Moto Laser. Todos lançados no Brasil pela Glasslite.
A série
Nos Estados Unidos a série foi lançada um pouco antes, em janeiro de 1985. A história era a mesma premissa manjada de sempre. Um policial sofre um acidente e tem de sair das ruas para fazer trabalho burocrático. Nesse meio tempo, aparece um cara maluco do governo e diz que pode ajuda-lo a se recuperar desde que ele tope entrar em um projeto ultra secreto do governo. O tal projeto era a Moto Laser, uma moto de combate super equipada e computadorizada. Enfim, quem não toparia?
A série durou pouco, 13 episódios. Eram um episódio piloto mais longo e 12 episódios de 50 min. A série teve participação de alguns atores que ainda nem eram tão famosos, ou eram desconhecidos. O vilão era ninguém menos que Christopher Lloyd, o bom e velho Doutor Emmett Brown de De Volta Para o Futuro. No segundo episódio lá estava George Clooney, todo rapazote, com 23 anos de idade e na sua quinta aparição na tela pequena, antes de participar de qualquer filme para o cinema. Aliás, Clooney chegou a ser escolhido pelo produtor da série para o papel principal mas o canal ABC não topou.
Os episódios eram exibidos aos domingos as 17hs na Rede Globo. Antes disso, houve uma disputa pelos direitos de televisionar Moto Laser entre Globo e SBT. Pra variar, a Globo levou. A Record, sempre atrasada e feito barata tonta, comprou os direitos 5 anos depois, quando ninguém mais queria saber da série, e passou a exibir Moto Laser nas terças-feiras no horário nobre.
Confira a abertura da série:
Outra participação de peso nos bastidores foi do designer Andrew Probert que desenhou os concepts da moto. Pra ser sincero, olhando hoje, a moto é um trambolho horroroso e feio de doer. Mas na época parecia a coisa mais linda do mundo e, como éramos garotos, qualquer coisa ficava linda disparando mísseis e lasers.
Andrew foi o responsável em 1979 pelo redesenho da famosa nave Enterprise para o primeiro filme de cinema da série Jornada nas Estrelas. Também desenhou a mesma nave para a nova séria da franquia, Jornada nas Estrelas – A Nova Geração. Em 1983 desenhou o helicóptero da série Águia de Fogo, baseado em um helicóptero Bell 222 e, surpresa, ele também trabalhou como designer no filme De Volta Para O Futuro fazendo story boards e, posteriormente, trabalhando no desenho do icônico DeLorean máquina do tempo, desenho que foi iniciado por outro artista, Ron Coob. O mini currículo do homem é só para deixar claro que ele não era qualquer designer.
A música tema era do famoso e respeitado coletivo alemão de música eletrônica, Tangerine Dream. Além disso, na trilha sonora, estavam momes como Mitch Murder, artista sueco considerado como um dos responsáveis por popularizar o gênero conhecido como syntwave, e também Bruce Springsteen como sua famosa canção Dancing in the Dark.
Na série o herói se chama Jesse Mach e seu amigo, cientista maluco que fica nos bastidores monitorando e assistindo a moto, é Norman Tuttle. Os dois funcionam juntos e com um time já que Norman fica em uma sala de controle toda computadorizada. Uma das cenas que fez a garotada perder o fôlego é a moto saindo de seu esconderijo já que a saída é um outdoor disfarçado que se abre e a moto já sai voando “no grau”. O ator Rex Smith, que fazia o heroi, era motociclista experiente e fez a maioria das cenas de fato andando com a moto. Dublês foram utilizados para as cenas perigosas.
Uma cena engraçada do episódio piloto é quando acontece uma aposta em torno de Jesse Mach, com policiais apostando dinheiro para ver se ele consegue ou não pular de moto por sobre alguns carros de polícia. Nas cenas em close, a moto é volumosa, grande, típica moto da polícia americana, talvez uma Harley ou Kawasaki. Mas quando a câmera corta da cena da moto correndo em direção a rampa e passa para a cena da moto subindo a rampa e prestes a voar pelo ar, a moto é magrela, pequena, uma típica moto de uso misto com suspensões altas. Talvez naquele tempo não havia grana para pagar um continuista…
Assista a cena onde a moto é trocada no meio do salto!
As motos
Três motocicletas foram utilizadas como base para o monstrengo da série.
Para o episódio piloto a moto foi construída sobre uma Honda XL 500 1983 (que nunca deu as caras por aqui).
Nos episódios seguintes foram utilizadas outras motos como base, três Honda XR500 1984 e onze Honda CR250.
As CR250 tem uma explicação: como eram menores, mais leves e com motores 2 tempos, eram utilizadas para as cenas de ação onde aconteciam os saltos, piruetas e macaquices com a moto. Além disso, eram em maior número pelo fato da moto passar o tempo inteiro caindo aos pedaços com aquele monte de carenagens construídas em fibra de vidro. Portanto, metade delas ficavam na oficina pra reparos enquanto a outra metade ficava disponível no set de filmagem.
Ao longo dos episódios dá pra notar que o desenho da Moto Laser muda sutilmente, de acordo com cada produtor ou designer. Ela começa com um “bico” bem quadrado e acaba, mais para o final da série, com linhas mais arredondadas e suaves.
As especificações fictícias da Moto Laser
Modelo: Projeto do governo ultra secreto
Velocidade máxima: 320 Km/h,
Velocidade no modo Hyperthrust: 480 Km/h
Armas: canhão laser, metralhadoras, lançador de foguetes
Especiais: câmeras infravermelhas, sistema de salto de ar comprimido, on e off road
Das quinze motos, 14 sumiram. Restou apenas uma que foi restaurada por um dos dublês da série e acabou indo parar no museu Cars of the Stars, na pequena cidade de Keswick, na Inglaterra. Acredite ou não, até os dias atuais, tem muito fã construindo réplicas da moto por aí.
A Honda, fazendo um papelão, entrou com um processo contra os produtores alegando que o nome Street Hawk lembrava muito o nome da motocicleta Nighthawk. Porém, assim que a série acabou, desistiram do processo.
Não é preciso dizer que, se você procurar, você encontra todos os episódios dublados pela internet afora para matar a saudade.
Pelo que dá pra lembrar, Moto Laser foi uma das poucas produções televisivas que tinham como coadjuvante/estrela uma moto. Para nós, que sempre curtimos moto, foi pouco, mas, de certa forma, o seriado certamente despertou a paixão pelas duas rodas em muita gente. Assim como nossa primeira volta de moto a gente nunca esquece, Moto Laser, para alguns, talvez esteja lá, guardada com carinho, nas lembrancas de infância na frente da TV nos fins de tarde de domingo.