Muita discussão pela internet afora (novidade…) se fez com a Royal Enfield oficialmente no Brasil. Deixando de lado o comportamento de consumo e julgamento peculiar do público consumidor brasileiro, preparamos um comparativo completamente racional para quem quer ter uma visão objetiva, sem rasgação de seda ou depreciação dos modelos da Royal disponíveis no Brasil. Haters gonna hate.
Antes de qualquer coisa é preciso lembrar que o brasileiro, quando o assunto é motocicleta, em sua maioria, considera apenas duas coisas: cavalaria e cilindrada. Temos essa mania, talvez fruto de algum tipo de complexo de vira-lata, de procurarmos sempre status na potência, velocidade final e sei lá eu mais o quê. Uma prova disso é o sucesso tremendo que as quatro cilindros naked da Honda e Yamaha fizeram e ainda fazem por aqui. Grande parte do público quer uma motocicleta para ostentar, sentir-se imponente e, na pior das hipóteses, cortar giro acreditando que está impressionando alguém quando na verdade está sendo um tremendo de um mala inconveniente.
E esse comportamento vem de longe. A própria Agrale, entre o meio dos anos e 80 e meio dos anos 90, já sacava isso e fazia questão de fazer duas coisas para agradar um público que só enxergava cilindrada: escondiam a cilindrada da moto e nomeavam as mesmas com a potência. Daí as Agrale com 16.5, 27.5 e 30.0 no nome da moto.
Diante dessa visão distorcida sobre motos da maior parte do público, nunca foi tarefa fácil para nenhum departamento de marketing de qualquer marca convencer os consumidores sobre as qualidades de suas motos, sejam elas grandes ou pequenas. Uma prova disso é a resistência enorme às bicilíndricas (ótimas, diga-se de passagem) que persiste até hoje. Se não é uma quatro cilindros barulhenta, não é uma moto bacana.
Poucos consumidores apostam na racionalidade de entender o uso que se quer fazer da moto para decidir qual o melhor modelo. É sabido que número de cilindros, taxa de compressão, diâmetro e curso de pistão, tipo de suspensão e uma série de outras coisas mudam completamente o comportamento de uma moto justamente com a intenção de orientar o tipo de uso que se vai fazer dela como viagens longas, uso urbano, uso misto e por aí vai.
A Royal, no Brasil, tem três modelos diferentes que, na verdade, são quase a mesma moto. E isso não é um julgamento de valor. Todas as fabricantes a partir de um mesmo motor e base fazem o máximo possível de modelos diferentes para terem um alcance maior de público com mais opções a um menor custo de produção. Com a Royal não seria diferente. Os modelos são a Bullet, a Classic e a Continental. Todas as três com 500 cilindradas, monocilíndricas e praticamente com a mesma potência e torque. A Continental, estilo cafe racer, é levemente diferente por ter um curso de pistão maior dando a ela um pouco mais de potência e diferença no torque máximo. De qualquer maneira, as três tem um estilo retrô. As Bullet e Classic na pegada dos anos 30 e 40 e a Continental na pegada dos anos 50 e 60 abarcando a onda do movimento cafe racer.
Pelo motor monocilíndrico, potência modesta (devido ao único cilindro) e entrega de torque máximo em rotações mais baixas na faixa de 4.000 RPM (o que é bom), racionalmente, as Royal são de fato uma opção para moto de uso urbano. Além disso, um argumento também a favor das Royal, teoricamente, seria a robustez e simplicidade de um monocilíndrico mais moderno e com injeção eletrônica. O diferencial em relação ao que temos no mercado é justamente o visual e todo o storytelling (que o povo adora) sobre a tradição longeva da marca. Também temos o fato de que a oferta de monocilíndricos de cilindrada média é quase inexistente. Um comparativo desleal e completamente sem sentido seria a Yamaha XT660 que é uma moto completamente diferente e de uso misto. Mas o consumidor de uma Royal estilo retrô e um XT600 são seres de dois planetas diferentes.
Mais uma vez, o departamento de marketing da marca, como todos os outros, se viu em apuros para tentar conquistar a atenção do peculiar público brasileiro. Apostou no storytelling da tradição da marca, maquiou a questão da baixa potência das motos declarando potência em bhp (brake horse power – explico mais adiante) e tentou se aproximar de um público jovem (ou bancou o tiozão que quer se enturmar com a galera) em um discurso marketeiro típico de “experiências”, “aventura”, “exploração” e até uma hashtag meio esquisita falando em #motopurismo. Mas não quer dizer que isso é ruim. É natural. É um malabarismo que todos os departamentos de marketing tem de fazer para chamarem atenção de um público que atende muito mais ao apelo emocional do que o racional, mesmo que o discurso soe forçado e pouco crível.
A conclusão final e completamente cerebral, tirando todo o papo, teoricamente desnecessário, de vendedor que quer impressionar, é que a Royal pode ser uma ótima opção de uso urbano e viagens curtas com algumas vantagens sobre suas concorrentes de mesma faixa de potência e cilindrada. Vantagens como o estilo único, diferente de tudo o que vemos por aí; provavelmente um seguro muito barato pelo fato que os meliantes não vão querer nem saber dela (o que para as grandes cidades é ótimo) e, teoricamente, pelo fato de ser um motor simples e mais robusto com uma manutenção baixa e barata.
Só resta saber sobre rede de concessionárias, peças e atendimento pós venda. O que é, geralmente, o que define se uma marca vai sobreviver ou não no país.
Falando sobre o Brake Horse Power. Como uma medida de tentar dar um up na declaração de potência das motos, para agradar ao brasileiro Joselito que só quer saber disso, a Royal declarou sua potência ao público em Brake Horse Power que nada mais é do que uma medição já datada que permite retirar algumas coisas como filtros, motores de partida e outras artimanhas para medir a potência do motor antes da roda e, consequentemente, sem perda pela transmissão, diferencial (no caso dos carros) e outras coisas. Obviamente é a medida preferida pelos fabricantes que querem vender “potência”.



Posto todo esse papo, quais seriam as motos, teoricamente e numa visão completamente racional, rivais das Royal?
Pois bem, tomamos com referência três coisas combinadas: porte, cavalaria (entre 20 e 40) e, principalmente, o uso a que se destina (urbano). Se fossemos colocar na conta cilindrada e estilo não haveria nenhuma “rival” para comparar. Além disso, tivemos de apelar para os bicilíndricos pois se considerássemos apenas um cilindro, teríamos pouquíssimas concorrentes.
Basicamente, tentamos encontrar motocicletas semelhantes no sentido do uso que se fará delas, como é a proposta da Royal: o uso urbano e para o dia-a-dia. Obviamente são motos que não tem a pegada retrô e o estilo da Royal mas são motos que tem exatamente a mesmíssima premissa. A Royal leva a vantagem de se diferenciar de todas pelo visual e não sofrer quase nada com o olho grande dos amigos do alheio como sofrem, por exemplo, as pequenas da Yamaha (Fazer 250) e Honda (CB Twister). Além disso, por valor parecido, se você não se importa com estilo e exclusividade, dá para levar para a garagem motos excepcionais em desempenho como a Kawasaki Z300 ou a Yamaha MT03.
É claro que se pararmos pra pensar com a emoção, como faz nosso povo, acharíamos a comparação sem sentido. Talvez seja. Mas a grande questão é que em tempos de cintos apertados é sempre bom comparar preços, vantagens e desvantagens para entender onde está o melhor custo benefício. O final, como diriam Antônio Fagundes e Tony Ramos (entre outros), você decide.
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