Encontrar sua tribo quando o assunto é duas rodas nem sempre é fácil. Apesar de muita gente negar, existe sim uma segregação quando se trata de rodar em grupos por aí. Além disso, nas grandes cidades, com trânsito cada vez mais carregado, é quase impossível fazer um passeio tranquilo em meio a vias entupidas de carros e motoristas cada vez mais estressados. Foi pensando nisso e inspirado em um passeio de carros antigos que nasceu um dos passeios de moto mais interessantes da maior capital do país.
Em 2014, percebendo que era cada vez mais difícil reunir um grupo de amigos motociclistas para um passeio despretensioso e que não exigisse planejamento prévio, Guilhes Damian (editor de Motocultura) criou um pequeno grupo fechado no Facebook cujo objetivo era uma espécie de mural de recados entre amigos para procurar um parceiro para dar uma volta de moto. O grupo não deu muito certo mas, mesmo assim, continuou por lá e os passeios de uns 5 ou 6 amigos com motos de diferentes estilos passou a acontecer com uma certa regularidade. A ideia era fugir do stress de rodar durante o dia e, para isso, os passeios sempre aconteciam à noite saindo de um ponto, dando umas voltas aleatórias e parando em algum lugar interessante para tomar alguma coisa, comer e bater papo.
Em um segundo momento, quando os amigos perceberam que era muito interessante rodar à noite (principalmente nos dias quentes) pelo fato do trânsito ser mais tranquilo e a cidade iluminada constituir um cenário bem bacana, Guilhes entendeu que aquilo era tão legal que não precisava ficar só entre aquele pequeno grupo. Inspirado por um evento que sempre admirou, a Corrida Maluca, um passeio regular super interessante dedicado a carros antigos, resolveu criar o Free Spirit Night Race. Free Spirit veio do nome dado ao grupo fracassado do Facebook, criado lá no começo, e o Night Race, obviamente, veio do fato do passeio ser sempre noturno e fazer uma brincadeira no nome chamando de “Corrida” (a inspiração do Corrida Maluca). Assim, o evento passou a ser aberto à todos, regularmente, na rede social do Mark Zuckerberg. A ideia permanecia a mesma, sair de um ponto da cidade, rodar um pouco e chegar até um lugar legal pra jogar conversa fora e curtir os amigos.
No começo a ideia era reunir motos customizadas, mas nunca restringindo a participação de qualquer outro tipo de moto. Mas, rapidamente, Guilhes percebeu que aquilo era também uma bobagem e um tipo de segregação burra desnecessária. Ao longo do tempo a pegada foi deixando bem claro que era um passeio aberto a qualquer amante da duas rodas independente da moto, cilindrada ou qualquer outra coisa pois, no fundo, o mais importante eram as pessoas e não as motos. E isso acabou reunindo de forma fantástica a tribo dos que não tem tribo ou não querem ser rotulados ou taxados.
Arrisco dizer que muita gente que rodava sozinha ou não tinha vontade de rodar em grupo por medo de sofrer algum preconceito besta, ou por ser iniciante ou por não ter a moto reluzente pica das galáxias mais foda do planeta, passou a se sentir bem vindo e acolhido dentro do grupo e do passeio.
Uma diversidade de pessoas e máquinas tomou conta do passeio e talvez tenha transformado o Free Spirit Night Race em um dos passeios mais liberais, democráticos e divertidos. Uma coisa é fato, a gente precisa admitir que tem sim preconceito e panelinha dentro do motociclismo. Falar que não tem é mentir pra si mesmo. E cada vez mais o passeio foi levantando uma bandeira contra essa coisa de restringir tipo de moto, cilindrada ou seja lá o que for.
O Free Spirit Night Race acabou virando um máquina de fazer amigos e um manifesto contra a pataquada de grupos disso ou daquilo pois, como o ditado manjado, o vento no rosto é o mesmo pra todos. Além disso, segregar só vai fazer com que você deixe de conhecer pessoas interessantes, diferentes de você e que pensam diferente de você onde é justamente quando acontece o aprendizado , a troca e o crescimento como pessoa. O passeio teve como semente um grupo de amigos que sempre estiveram próximos e que sempre estiveram envolvidos com motociclismo em outros grupos eventos, etc. Costumo dizer que é tudo farinha do mesmo saco, só muda o nome. (risos).
A ideia, como conta o criador, é ajudar todo mundo de alguma maneira, ajudar a divulgar seus pequenos negócios, iniciativas e passar um tempo legal juntos.
Ninguém quer ficar rico e ganhar dinheiro com evento que continua sendo completamente informal e orgânico desde sua criação. A ideia está longe de ser essa. Até por isso o evento é completamente gratuito. Os bares e estabelecimentos que recebem a gente são lugares escolhidos por nós e com eles é conversado previamente se podem ou não receber o evento. Até por que a gente não quer aparecer de surpresa com um grupo de mais de 50 pessoas sem avisar e fazer da noite dos caras um inferno. A ideia é sempre levar o grupo a um lugar diferente todas as vezes, até para que conheçam melhor a cidade onde moram e que percebam que tem muito lugar legal fora do nosso radar ou dos bairros mais “badalados”. Se alguém tem uma linha de camisetas legais e quer levar na mochila pra tentar fazer um trocado, é bem-vindo. Se alguém vende cachorro quente e quer ir até o ponto de partida pra fazer um trocado, é bem-vindo também. A gente até agradece pois vai matar a fome da galera. A maior regra é não ter regra e respeitar as diferenças e anseios de todo mundo.
Na verdade, a única regra que sempre está em todos os eventos é pedir para que os participantes sejam civilizados, respeitem todas as normas de trânsito e não sejam uns tontos cortadores de giro carentes de atenção. A minha primeira maior preocupação é a segurança de todos. A segunda, pedindo que todos sejam legais, educados e coerentes, não só em grupo na rua mas também nos lugares onde vamos, é justamente para tirar a imagem ainda negativa dos motociclistas, é pra passar uma imagem boa e positiva do motociclismo pras pessoas que vem o grupo na rua. Por isso minha insistência em obedecer à risca todas as regras de trânsito. Também evito rodar em condições ruins como chuva, por exemplo. Sempre que chove, cancelamos. Acho que aconteceu uma vez, nem me lembro. Acho perigoso um grupo grande rodando em condições de piso molhado e com gente que talvez não tenha o hábito de rodar em grupo. Meu maior pesadelo seria alguém se machucar. Por isso sou chato mesmo. Insisto no bom comportamento e sou um mala quanto a organização. Talvez esse seja um dos fatores que tornou o passeio um sucesso mesmo que muita gente talvez me ache um control freak. (risos)
E, no meio da bagunça organizada, eles se entendem. E tem dado muito certo. Os passeios atualmente tem reunido mais de 100 motocicletas de todos os tipos e é muito, muito difícil sair de algum deles sem um sorriso no rosto.
Você também pode conferir uma matéria legal sobre o passeio no Garagem Cafe Racer.
Se você mora em São Paulo e nunca participou de um está mais do que convidado. Os passeios agora acontecem regularmente uma vez por mês. O ponto de partida é sempre o Estádio do Pacaembu e lá o grupo fica por mais ou menos uma hora e saem em direção ao lugar escolhido como ponto de chegada. Motocultura também é apoiador do Free Spirit Night Race!
Para você entender do que a gente está falando, abaixo tem um vídeo em duas partes do passeio que aconteceu em Abril de 2017 com as imagens captadas justamente pelo Wel Calandria do Classic Riders Brasil. Aperte o play que garantimos que você vai ter vontade de participar!
Serviço
Free Spirit Night Race
Onde: Estádio do Pacaembu – São Paulo – SP (ponto de partida)
Quando: uma vez por mês
Para saber as datas: acompanhe o Classic Riders Brasil e o Free Spirit no Facebook.
Algumas fotos dos eventos