Os veículos automotores, em especial as motocicletas, tem usos variados e, por isso mesmo, o mercado oferece uma infinidade de marcas, modelos, propostas e conceitos diferentes. Modelos destinados ao trabalho e o dia-a-dia, por exemplo, normalmente são mais simples e robustos, de boa durabilidade e manutenção mais barata e fácil. Desta forma, é mais usual termos modelos monocilíndricos destinados a esse uso. Já motos com proposta de passeio, turismo e esporte, entre outros apelos, são modelos que apresentam uma maior “sofisticação”, assim como motores mais complexos, como os de 2, 3 ou 4 cilindros. Na contramão esta a Royal Enfield que tem a proposta de oferecer modelos com um certo “status” mas com motores monocilíndricos mais simples, robustos e econômicos.
A marca é a mais antiga fabricante de motocicletas na ativa no mercado mundial. De origem inglesa mas atualmente propriedade de um grupo indiano que assumiu de forma intencional e estratégica oferecer modelos não só de características clássicas, mas de fabricarem em pleno século XXI os mesmos modelos que produziam ha mais de 50 anos.
A Royal Enfield cultiva a ideia de purismo, utilizando a hashtag #motopurismo como mote da campanha de seu lançamento por aqui. O que dá para entender é que a marca esta se valendo de seus modelos clássicos e seu nome, que tem tradição na história do motociclismo, para se posicionar de forma diferenciada, oferecendo uma linha onde o saudosismo é a deixa para reunir a parte dos motociclistas que deseja resgatar o prazer de andar de moto da forma mais pura e simplificada. Sabe aquele lance de sair de casa sem pressa, curtindo a paisagem e esquecer quantos minutos e horas estão passando? E ao chegar ao destino, participar de uma roda de conversa sobre motos e experiências vividas? É isso.
Tive a oportunidade de rodar 140 Km com 2 dos 3 modelos que a marca trouxe para o Brasil: a Continental GT, com uma proposta mais esportiva, e a Classic Chrome, de proposta mais clássica, como o próprio nome sugere.

Em estradas vicinais do interior paulista, cheias de pequenas retas e curvas, foi uma ótima oportunidade para sentir como estas máquinas de concepção tão fieis a sua origem, na primeira metade do século passado, iriam se comportar. A Classic tem seu projeto original da década de 30, já a Continental GT na década de 60.
Por ter o visual que mais me agradou, com design inspirado nas Cafe Racers clássicas, a Continental GT era a que mais eu desejava testar.

O acabamento da pintura do tanque é impecável, mas as demais peças não mostram o mesmo cuidado. Mesa e bengalas, por exemplo, recebem uma pintura prata, de acabamento que poderia ter um pouco mais de atenção e qualidade. Esta mesma percepção se estende as poucas peças cromadas que o modelo exibe. Pra mim, isso não seria problema em uma eventual compra. Até por que, se eu decidir pela compra, no dia seguinte seria desmontada para fazer uma customização personalizada. (Fizemos um pequeno compilado de customizações utilizando as Royal como base que você pode conferir aqui)

Dando a partida, o ronco tradicional e a vibração característica dos motores monocilíndricos entram em ação. O escapamento, ao meu ver, ou melhor, ouvir, pede um pouco mais de esportividade. Mais um item que se resolveria fácil com a troca por um mais esportivo.
O banco é confortável e de bom tamanho. Há espaço suficiente para se posicionar mais próximo ao tanque e atacar melhor as curvas, ou se afastar e “carenar” nas retas. Sim, eu sei que ela não tem carenagem, mas é uma expressão que se costuma usar, para definir a posição recuada e deitada sobre o tanque de combustível para melhor penetração aerodinâmica. Os semi guidões sobre a mesa, e não abaixo como as cafes mais tradicionais, favorece o conforto. Rodei mais de 100 km com ela sem sentir qualquer incômodo. A posição das pedaleiras estão ergonomicamente bem posicionadas, favorecendo um adequado triângulo guidão/acento/pedaleira.

Primeira marcha engatada e bora rodar. E que rodar macio. O bom torque do motor de 535 cc, exclusivo do modelo GT, aparece logo nos primeiro giros fazendo a moto deslizar suave e tranquila. Antes mesmo dos 4.000 RPM já se quer passar a próxima marcha, o giro cai pra pouco mais dos 1.500 RPM e o motor mostra toda sua elasticidade. Vale ressaltar que esta talvez seja a melhor qualidade deste monocilíndrico robusto. Pessoalmente gosto de motos europeias, de poucos cilindros, justamente pelo grande torque que apresentam, ao contrario dos motores de grande giro, que só se mostram em altas rotações e com sede por velocidade. Já estes motores “torcudos” tem uma retomada deliciosa em percursos mais “travados”, respondendo como nenhum outro nas saídas de curva.
Falando em curvas, achei a ciclística muito bem acertada. Nas suspensões vale ressaltar o belíssimo amortecedor traseiro com reservatório de gás. O conjunto é muito bem dimensionado para o modelo, no ponto certo, nem muito dura para não comprometer o conforto e nem muito mole para não comprometer a estabilidade em tocadas mais esportivas. Somando isso a uma moto esbelta e compacta tem-se uma moto muito ágil nas mudanças de direção e muito na mão. É impressionante o que faz de curva e parte disso é resultado atribuído dos pneus Pirelli Demon que funcionam muito bem no conjunto.

E falando em conjunto, os freios não poderiam ter melhor “pedigree”. Nada menos que pinças Brembo. Freio a disco simples tanto na frente quanto na roda traseira. No inicio achei um pouco “borrachudo” o freio dianteiro, mas isso deve se resolver trocando o fluido de freio original por um de classe superior, talvez um DOT4 ou até DOT5. De qualquer forma, deixando de lado esta sensação pessoal, os freios são muito eficientes. Inclusive acho que esta é a primeira moto que piloto, na qual o freio traseiro funciona de verdade. Alias, freia mais do que precisaria frear. Para pilotos iniciantes convém deixa-lo “menos eficiente” a fim de evitar o travamento da roda traseira em pisos com condições ruins de aderência.

O outro modelo testado, a Classic Chrome, tem um visual clássico muito elegante e, esta versão específica dela, ao meu ver, mostra uma qualidade de acabamento bem superior, inclusive nos cromados que predominam em quase toda a moto. O que mais diferencia este modelo do Continental GT, além da questão estética, é a posição de pilotagem. Muito semelhante a de um scooter, sentado, ereto e com os pés nem avançados e nem recuados, de extremo conforto. Deu a impressão de que poderia rodar o mundo sem me cansar. O que mais me impressionou foi o fato de que estas características não prejudicaram em nenhum ponto a ciclística e o fantástico desempenho em curvas como o que descrevi para a Continental GT, muito semelhantes ou talvez até melhor, arriscaria dizer.

Minha opinião? Se você é daqueles motociclistas sem mi mi mi, que não tem rios de dinheiro para comprar uma moto e mesmo assim quer algo com personalidade, para se destacar no dia a dia, e ainda tirar uma onda no final de semana, escolha o modelo que mais combina com sua personalidade e seja muito feliz com uma Royal.

Eu mesmo estou pensando seriamente em adquirir uma. Me diz? O que o mercado pode oferecer com tanta personalidade nesta faixa de preço? Que, a meu ver, é muito coerente e acessível partindo de R$ 18.900,00 para a Bullet e chegando a R$ 24.500,00 para a Continental GT ABS.
Os modelos testados tem preço de R$ 23.000,00, para a Continental GT sem ABS, e R$ 21.900,00 para a Classic Chrome sem ABS.
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